“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver” Amyr Klink

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Puerto Madryn - Península de Valdez

Geralmente o mochilão é feito todo por terra. Inicia-se a viagem de algum lugar por avião e o retorno para casa feito pelo mesmo meio, porém de um local distante. Portanto, entre estes dois pontos (início e fim) há um longo percurso a ser percorrido, geralmente de ônibus ou carona.

A opção de se deslocar por terra e de ônibus não é apenas a mais barata, mas também a forma que nos permite contemplar melhor as paisagens, interagir com locais e outros mochileiros, descansar entre um destino e outro, e se utilizar de traslados noturnos para melhor aproveitar o tempo. Um guia nos disse uma coisa interessante, “viajar de avião é ótimo, porém não lhe permite ter uma noção real de distância e sentir a amplitude da região”.

Entretanto, como nosso tempo era curto e as distância continentais (total de viagem 15.000 kilometros), já no Brasil decidimos aproveitar o pacote oferecido pela Aerolíneas Argentinas, chamado “Visite a Argentina”. A exemplo das companhias européias, compra-se um pacote de trechos por um preço ecônomico fixo. Sendo assim, partindo de El Calafate, tínhamos um vôo agendado para Trelew, cidade vizinha à Puerto Madryn, principal acesso ao nosso próximo destino: Península de Valdez (quem puder dê uma pesquisada no google imagens).

Ocorre que para nossa surpresa e desgosto, o vôo estava cancelado, e, pior, já não havia vôos para Trelew há um mês, devido às cinzas do Vulcão chileno Puyehue. Embora Trelew se localize na costa do Oceano Atlántico e o Vulcão esteja do outro lado da cordilheira, próximo ao Pacífico, via de regra os ventos sopram do Oceano Pacífico para o Atlántico, trazendo as cinzas em linha reta para região de Trelew.

Foi um momento tenso e a Kakau estava justificadamente irritada. Poucos dias antes da data fomos à companhia aérea confirmar o vôo, pelo contrário, disseram-nos que estava tudo “Ok”. Ninguém nos avisou que há um mês os vôos para Trelew estavam cancelados e havia grandes chances de não conseguirmos usar aquele trecho. Certamente se despudessemos desta informação, teriamos tempo hábil para analisar alternativas. Eu não fiquei mais tenso porque já estava preparado psicologicamente para isso. Mario, amigo e cliente argentino, avisou-nos que a Aerolíneas Argentinas não era de confiança. Eu também estava acompanhando na mídia o caos aéreo gerado pelas cinzas do vulcão. A indignação provém do fato daquela companhia vender passagens para trechos conhecidamente com problemas e sequer avisar seus clientes dos riscos existentes para que possam conscientemente assumi-los ou não. Vamos procurar um “bom advogado” (risos)!

Fato é que precisávamos tomar uma decisão rápida. Tomar a opção ofertada pela companhia de seguir até Buenos Aires e depois para uma cidade próxima à Bariloche (pois Bariloche também não estava recebendo vôos), desta forma, abriríamos mão da Península de Valdez ou seguir de ônibus. Kakau manifestou desejo “irresistível” (risos) de ver “las ballenas” e “los pinguinos”. Aquela pensínsula é mundialmente conhecida pelo local de acasalamento e reprodução das baleias franca austral, bem como região onde está a maior concentração de pinguins do planeta. Fizemos algumas ligações do aeroporto para companhias de ônibus, fizemos alguns cálculos e decidimos seguir de ônibus, saindo direto do aerporto para rodoviária, onde embarcariamos numa viagem de vinte horas.

A viagem foi tranquila. Os ônibus argentinos são excelentes, percorrendo velocidade segura e constante pelas intermináveis rodovias patagônicas. Nem precisa dizer que dormimos o trajeto todo. Chegamos na pequena e acochegante Puerto Madryn e nos hospedamos sem dificuldade. Na primeira oportunidade fomos caminhar na orla daquela cidade portuária. Já naquela imensa baia se podia avistar algumas baleias a distância, aumentando nossa ansiedade para o tour que fariamos no dia seguinte.




 Dividimos quarto com um turco (Mehmet) e uma alemã (Ann-Kathrin), os quais coincidentemente aderiram ao mesmo tour para conhecer a Península. Mehmet e Ann não só nos acompanhariam neste passeio, mas também em muitas outras viagens, estreitando um vínculo de carinho mútuo e amizade, o que será relatado nas próximas etapas.

A nossa passagem pela Península de Valdez foi sem sombra de dúvida um dos momentos mágicos da viagem. Obrigado Kakau pela perseverança! Passamos o dia todo circulando neste istmo patagônico, com superfície de 4.000 km², repleta de salares, falésias, enseadas e animais migratórios sensacionais. Esta região foi intitulada pela Unesco como Patrimônio Mundial da Humanidade.














Pudemos avistar dezenas de baleias e seus filhotes não só a poucos metros da praia, mas também embarcados em um catamarã. O passeio de barco entre as baleias foi inequecível. Imagine-se embarcado numa baía repleta do maior mamífero do planeta e seus filhotes imensos filhotes recém nascidos. Não foram poucas as vezes que presenciamos os saltos cinematográficos destas baleias de oitenta toneladas.

A baleia-franca-austral passa os meses de verão em zonas onde abunda o krill (camarão minúsculo) junto à Antárctida. No inverno migram para norte para se reproduzirem, podendo ser vistas junto às costas da Argentina, Austrália, Brasil, Chile, Moçambique, Nova Zelândia e África do Sul. A baleia franca austral se distingue das outras pelas calosidades (sim, calos) que possui na cabeça, o que pudemos ver muito de perto. Foram muitas às vezes que vimos mãe e filho passarem por debaixo do barco, nadando lentamente nas águas cristalinas.

Tivemos o privilégio de ver a um metro de distância um filhote albino. Em alguns momentos, parecia que as baleias queriam interagir conosco, ao elevar fora d´agua, ao lado do barco, sua imensa cabeça ou seu rabo, permanecendo imóvel por longo tempo. O comandante disse que aquelas baleias são sensíveis aos fotógrafos lentos e distraídos. Vimos de muito perto cenas clássicas de fotografias famosas. Verdade seja dita, o barco era grande e balançava muito, razão pela qual não conseguimos registrar todas as imagens, digo fotografar, pois registrado está, em nossas memórias.







Acima a linda baleia franca austral e ao lado seu filhote albino. Emocionante!









Se não bastasse essa emocionante experiência, ainda percorremos a península para visitar colônias de Elefantes Marinhos. Estes animais são muito pitorescos. A fêmea atinge 3,50 metros e o macho até 6,5 metros, pesando até 4 toneladas. Nos machos, o nariz se alonga numa espécie de tromba, que originou o nome popular da espécie, o qual também é utilizado para potencializar os grunidos usados para intimidar seus oponentes e seduzir suas fêmeas. Os elefantes marinhos passam cerca de 80% das suas vidas a nadar nos oceanos, podem estar até 80 minutos sem respirar e mergulhar até aos 1700 metros de profundidade!!!!





A época de reprodução dura apenas cerca de um mês, período em que as fêmeas se concentram em diversas colônias em praias e controladas por um único macho dominante (esse fanfarrão chega a ter dezenas de fêmeas em seu harém). Ao fim deste tempo, já fecundada de novo, a fêmea regressa ao mar abandonando o harém e as crias. Cada macho dominante tem que lutar contra invasões de vizinhos e tentativas de usurpação, ao mesmo tempo que tenta cobrir o maior número possível de fêmeas no seu território. A praia fica movimentada!
Por fim, visitamos uma colônia de pinguins. Estava iniciando naquela semana a chegada destes pinguins, conhecidos como Pinguim de Magalhães. Eles chegam aos milhares naquela região para se reproduzirem. A Kakau ficou emocionada ao ver de muito perto este meigo animal em seu habitat natural.




                                                           Los Pinguinos!!!!