“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver” Amyr Klink

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Santiago e San Pedro de Atacama

Eis as publicações que faltavam dessa maravilhosa viagem pela Argentina e Chile

De Santiago ao Deserto do Atacama


Deixamos a cidade chilena de Pucón realizados pelas fantásticas experiências, porém um pouco tristes por nos separarmos de Mehmet e Ann. Eles sabiamente decidiram ficar um pouco mais em Pucón, antes de partir para Santiago, onde embarcariam de volta para Alemanha, após 6 meses de viagem pela América do Sul.


Eu já tive a oportunidade de comentar isso com alguns amigos e direi novamente. É impressionante como as amizades surgidas nestas viagens tem uma intensidade fora do normal. Uma tarde, um dia ou uma semana de convivência formam vínculos muito fortes. Não foram poucas as vezes que num intervalo de tempo muito curto, tivemos oportunidade de conhecermos pessoas e formarmos uma intimidade e carinho mútuo que na maioria das vezes não construímos com pessoas que fazem parte de nosso dia-a-dia.


Viajar neste estilo, mochila nas costas e hospedagem em hostels, permite conhecer pessoas e fazer novos amigos de todo lugar do mundo. Pessoas que se propõem a viajar desta forma, geralmente são solícitas e abertas a novas amizades. Diferentemente de se hospedar num hotel, onde as pessoas mal se cruzam no lobby.


A maior parte das pessoas que conhecêssemos gostaria de viajar desta forma, mas justificam que lhes falta “coragem” ou “companhia”. Acredito que a falta de coragem decorre da falsa fantasia de que seria desconfortável, sejam os meios de transporte, seja a hospedagem. Não é verdade, quem já foi sabe que é tudo limpo, organizado e confortável. A ausência de companhia pode ser um impeditivo. Eu mesmo (Pablo) demorei para começar por falta de companhia, até que fiz minha primeira viagem sozinho, quando descobri que você pode viajar sozinho, mas jamais estará sozinho. As novas amizades são uma constante neste estilo de viagem e os momentos solitários são definitivamente pequenos.


Voltando ao relato, viajamos durante toda noite e chegamos muito cedo em Santiago. Estávamos decididos que a capital seria apenas um “trampolim” para nosso próximo destino, o norte do Chile. Depois de muitas semanas viajando por pequenas cidades e paisagens exuberantes, torna-se difícil desfrutar de uma grande metrópole. Concluímos que visitaríamos Santiago da forma que ela merece em uma outra oportunidade.


Mal chegamos na rodoviária de Santiago e já fomos buscar informações a respeito do trajeto Santiago a Antofagasta ou Calama, ambas no norte do Chile. Descobrimos que seriam mais de 28 horas de viagem de ônibus e que as opções de data eram escassas. Ficamos muito preocupados, pois o tempo urgia e não queríamos abrir mão de nossa proposta inicial. De posse das opções de ônibus, fomos buscar as opções de voo, quando descobrimos uma ótima opção, acima de tudo barato, junto a uma companhia local (Sky Airline). Enfim, logo naquela manhã compramos os bilhetes aéreos para Calama.  Como a saída sairia no dia seguinte,  fomos tranquilos passear em Santiago.


Confesso que passear por Santiago não foi muito entusiasmante. Depois de passar por paisagens naturais incríveis, uma cidade repleta de prédios, coberta de uma névoa de poluição, não tinha como nos surpreender. De fato, a cidade é bonita e charmosa, talvez numa próxima viagem, consigamos desfrutá-la melhor.


Visitamos os principais pontos turísticos, especialmente os Cerros (montanhas/morros) que proporcionavam um visual da cidade. Almoçamos no mercado municipal, como bons aficionados por frutos do mar que somos. Após um assédio irritante dos inúmeros restaurantes lá dispostos, optamos por aquele que aparentava ser o mais frequentado pelos chilenos locais. Comemos a famosa Centolla (uma espécie de caranguejo gigante). Eu, particularmente, esperava mais deste crustáceo. Achei sua carne com pouco sabor e consistência. O caranguejo que costumamos comer no Sul do Brasil é muito melhor, especialmente aquele preparado pelo Chefe Acácio, meu pai.





                                                        fotos da cidade de Santiago

Madrugamos no aeroporto e embarcamos para Calama (onde está a maior mina de cobre do mundo: Chuiquimata), haja vista ser esta a cidade mais próxima de nosso destino final, San Pedro de Atacama. Eu já tinha uma boa idéia da paisagem que encontraríamos, pois durante uma viagem para Bolívia e Peru fiz um tour próximo daquela região, partindo do Salar de Uyuni (Bolívia). Eu queria muito que a Kakau conhecesse aquela paisagem, totalmente diferente do que ela já havia visto, não só ao longo desta viagem, mas em toda sua vida.


Sobrevoar a pré-cordilheira, a Depressão Intermédia e a Cordilheira dos Andes foi uma grande emoção. Aquela imensa região inóspita surpreende, especialmente a nós brasileiros que não estamos habituados com alta montanha.


Do aeroporto de Calama a San Pedro de Atacama há opções de transporte público e vans. Acabamos optando pela van, a qual engasgou durante todo o percurso. O motorista nos explicou que devido à altitude, há falta de oxigênio no ar, dificultando a combustão. Enfim, ele se dizia enganado ao comprar um veículo não adaptado para aquela região.Toda aquela paisagem me remetia ao livro de que estava lendo em espanhol: La Casa de Los Espíritus, da Isabel Allende. Este livro descrevia com grande riqueza de detalhes o sul, Santiago e o norte do Chile.


A estrada é muito bonita e mística. Grandes longas retas e algumas subidas e descidas sinuosas. Há inúmeras zonas de escape para os caminhões que perdem o freio, seja em razão do calor, altitude ou velocidade. Não há árvores ou vegetação tradicional ao longo do percurso. A primeira vista da cidade gera um certo espanto, um remoto vilarejo, empoeirado, perdido ao meio do deserto, um oásis no deserto.






A cidade “surgiu” durante a exploração do sal, muito abundante na região. Era conhecido como “ouro branco”. A cidade e seus habitantes viveram períodos difíceis durante a queda das exportações de sal. Atualmente, o turismo é a sua principal atividade. Quase nunca chove ali, isto permite que as casas sejam de adobe (barro), humidade muito baixa (nariz, boca ... tudo fica seco) e há muita poeira em tudo. Água é um produto escasso e caro. Todo fornecimento de agua advém do degelo das montanhas, transportado por meio de canaletas, cuja tecnologia foi desenvolvida pelos povos Incas. Mal chegamos em San Pedro, seguimos para um dos tours mais famosos: Vale da Lua, Vale da Morte (ou Marte) e Por do Sol.
                                           
                                         Abaixo as construções tipicas da cidade

















No Vale da Lua (o nome já descreve a aparência do local), onde caminhamos nos desfiladeiros, cercados de paredes de sal, que emitem sons/ruídos em razão das rachaduras causadas pelas mudanças de temperaturas. O Vale da Morte (ou Marte) é espetacular, dizem os astrônomos que é a região da terra que mais se aparenta como Marte, cujo por do sol é o cartão postal da região, um momento mágico!


vale da Lua











Vale da Morte ou Marte












                    E o fantastico pôr do sol


Já no segundo dia cedo fomos ao Altiplano Andino, região onde eu queria muito que a Karina conhecesse. Altiplano é a parte alta dos Andes, perdendo em altitude apenas para os cumes e vulcões. Neste platô, que principia a 3.000 metros de altitude, a atmosfera é pura e cristalina, brinda-nos um céu azul constante e uma luz intensa. É lá onde geralmente se encontram os Salares, Lagunas, Géiseres, Vulcões, Camelídeos (lhama, vicunha, alpaca e o guanaco), Raposas, Flamingos, Condores, Cardones (gigantescos cactos) e outras paisagens exuberantes e únicas.


Neste passeio, paramos para conhecer o Salar de Atacama (3º. maior salar do mundo e onde está a maior produção de lítio do planeta). Ele é imenso, porém não é branco e regular como o Salar de Uyuni. Seguimos pela laguna de Chaxa (flamingos) e depois para as famosas Lagunas Miscanti, Verde e Minique. Neste ponto estávamos muito alto, a 4.120 metros de altitude. Caminhar se tornou difícil e a respiração pesada. Ainda havia resquícios de neve em plena primavera. Vimos um vídeo da Gloria Maria neste local no inverno, quando eles tiveram que abrir estrada entre o paredão de neve. Quem tiver curiosidade ai vai o vídeo dela: http://www.youtube.co.id/watch?v=vgbPBCc8NB8
                                                                  
                                                 O lindo Salar de Atacama (Deserto de Sal)




Os lindos Flamingos


                                                         

                                            Laguna de Chaxa





A caminho das Lagunas Altiplânicas


                                                               Laguna Miscanti



                                                                Laguna Minique



                                                                        Laguna Verde



Nesta região há um “passo” para Argentina, ou seja, uma estrada de acesso ao país vizinho. Vimos muitas máquinas reformando a estrada, despejando sal de forma a tornar a estrada mais acessível. No início achei estranho, mas nosso guia nos explicou que como nunca chove (há lugares onde talvez nunca tenha chovido), o sal é uma ótima opção de pavimentação.

                                                        A estrada de sal

Nosso último passeio no Atacama nos levaria aos Geysers. Saímos às 3 horas da matina, numa manhã fria, com destino a uma região mais fria ainda. Fomos orientados a levar roupas quentes, pois a temperatura estaria entre -10ºC e -20ºC. O objetivo era amanhecer no campo de Geysers, quando há maior atividade. Nosso café da manhã foi literalmente aquecido (café e leite) e cozido (ovos) dentro dos geysers, os quais lançavam água fervendo até 7 metros de altura.









Após o nascer do sol, a atividade diminui e fomos orientados a nos banhar nas piscinas termais. Eu já tinha tido esta experiência na Bolívia e sabia que entrar seria difícil, mas a piscina iria aquecer o corpo, fazendo muita diferença ao longo do passeio. A Karina resistiu para entrar, mas depois se deliciou com aquela experiência única, tirar a roupa numa temperatura abaixo de zero e se banhar numa piscina natural extremamente aquecida.


















Em seguida paramos numa Aldeia, ainda no Altiplano (inimaginável alguém vivendo naquele lugar inóspito), onde se vendia pastel de queijo de lhama e churrasco de lhama. A Karina sentiu a altitude e ficou sonolenta.


Alguns animais pelo caminho




Pequena aldeia perdida no meio do deserto



Nesta noite, nós iríamos fazer um tour para observar as estrelas. São 330 noites claras por ano e um dos céus mais limpos de todo o planeta. Não por menos, é lá onde está instalado o telescópio mais poderoso do mundo, batizado de Alma. Porém, infelizmente, naquela noite pairava no ar uma nuvem de poeira que forçou a agência a cancelar o tour.


Na manhã seguinte, cruzamos a fronteira com a Argentina, pelo “passo de rama”, com destino a Salta. Saímos de San Pedro de Atacama por volta das 10 da manhã. O ônibus era confortável e a viagem foi tranquila até a parada na fronteira Chile – Argentina. Foram 3 horas parados, super cansativo e desgastante. O que compensou o cansaço foram as maravilhosas paisagens na estrada, a pista era sinuosa e alguns trechos ficamos até com um pouco de medo devido ao ônibus passar rente aos penhascos.


















Neste percurso, atingimos a maior altitude de toda viagem. Havia um americano ao nosso lado no ônibus com um GPS que identificou 4.800 metros de altitude. Passamos muito próximos da tríplice fronteira (Chile/Bolívia/Argentina), na região do esplêndido Vulcão Licancabur, onde estive há alguns anos.